Gostamos de falar sobre o futuro das coisas: futuro das cidades, dos carros, dos celulares, da internet das coisas, das escolas e, claro, do trabalho. Por alguma razão, é fácil tecermos previsões plausíveis e argumentos convincentes. Alguns mais charmosos, outros mais catastrofistas, outros mais românticos.
Pensar no futuro do trabalho é voltar o olhar, no mesmo momento, para o presente do trabalho – o que vemos, acreditamos e sentimos que já está acontecendo agora, neste exato momento. Se o futuro é incerto, o presente está aqui e agora, dando pistas, sinais de possíveis tendências. Por isso, usamos no título a expressão “futuro do presente”, um tempo verbal que fala do que acontece após o momento presente, da fala, e também usado para expressar ordem e incerteza.
Do ponto de vista de competências a serem desenvolvidas para este futuro do presente, vislumbramos aquelas que possibilitem mais maleabilidade, permeabilidade e adaptabilidade, como a habilidade de articulação, a resiliência do relacionar-se e a escuta do que é e do que não é dito. Porém, será que essas competências estão só no discurso ou já dão sinais de existência na prática do dia a dia do trabalho?
Os desafios do líder “guru” e as novas nomenclaturas da liderança
No universo da liderança, por exemplo, ainda é forte a figura do líder “guru”, resolvedor dos problemas, para quem todos “escalam”, aquele que não tira férias, ou que trabalha durante as férias, sem o qual a equipe não tem referência no dia a dia. Como fica esse líder em eventuais estruturas ágeis, mais horizontais, com times colaborativos trabalhando por projetos, inclusive com membros de outras organizações, como no modelo de inovação aberta?
Esse líder guru ainda existirá nas empresas do futuro? Muito possivelmente, sim. As questões que se colocam é se este líder: 1) tem consciência de que está e se coloca nessa posição; 2) tem meios de detectar pontos cegos relacionados a este lugar; 3) desenvolve habilidades de adaptação a eventuais novos meio ambientes, novos rizomas empresariais e sociais. Tudo bem “estar” um líder guru, se souber conscientemente que está ocupando esse lugar e se estiver razoavelmente preparado para mudar de lugar, quando conveniente ou necessário.
O líder guru também tem o desafio de liderar adultos, profissionais, maduros, autoimplicados, sujeitos e não de liderar equipes de crianças crescidas. Os liderados, nesse sentido, também passam por um processo de transformação para o futuro do trabalho, saindo do paradigma “se tem alguém que me dá as respostas prontas, por que me importar?” para um posicionamento mais ativo e questionador.
Colocar o holofote somente no líder é deixar toda a equipe no escuro. Vamos trazer todos ao palco juntos. Dividir responsabilidades e angústias. Que todos sejam um pouco guardiães da cultura, como acontece nos esquemas de vizinhança solidária que alguns bairros adotam. Aprendizado e desenvolvimento da equipe por meio da responsabilidade, da autoimplicação, da autonomia com parâmetros.
O futuro do trabalho aponta para uma desmistificação, desglamourização, ”desgurutização” da liderança. Talvez seja um peso demasiadamente grande, desproporcional, com essa pessoa. Talvez seja um desserviço para com o desenvolvimento da equipe achar que somente um líder leve a cultura da empresa adiante, atinge resultados incríveis, etc. Cada vez mais, o líder atua num papel forte de articulação, mais do que de comando e controle. Essa articulação deriva de uma habilidade de desenhos de ciclos de compromissos com todos com quem interage, de clientes a fornecedores, do board à equipe.
A revisão dos estilos de liderança do futuro do trabalho já se expressa nas nomenclaturas que circulam dentro e fora das organizações: liderança positiva, liderança consciente, liderança shakti, liderança empática, liderança adaptativa, liderança líquida, liderança atenta… Nomenclaturas fixas não dão mais conta da não fixação do mundo, das relações pessoais e empresariais – parece estamos construindo um novo paradigma do líder caórdico, que combina e consegue ser maestro do que há de mais vivo na natureza e nas organizações: o caos e a ordem.
Que habilidades o líder do futuro (do presente) do trabalho deve ter?
Aprender a firmar compromissos precede de uma outra habilidade que se mostra estratégica para a vida: a escuta do que é e do que não é dito. A escuta das sutilezas, do que páira, do que está para além de reclamações do tipo “nas festas de aniversário da empresa, os bolos dos gerentes são maiores do que dos demais”. Nesse caso, a queixa não é o bolo, ele é só um veículo pelo qual uma ou mais queixas anteriores, mais profundas, estão se manifestando. Podemos substituir o bolo pelas queixas das vagas de estacionamento, do tamanho das mesas, etc.
A escuta do que páira pode desarmar verdadeiras bombas, possibilitar grandes compromissos, negociações, gestão de conflitos e desenvolvimento. Tudo começa com a escuta, com a percepção fina, com os sentidos atentos. O líder pode, sim, ser o primeiro a puxar essa fila – mas sem ser guru de ninguém.
Tudo isso passa pelo desenvolvimento da autoconfiança dos líderes, de sua capacidade de delegar e coordenar ações e de sua habilidade de negociação, para firmar acordos e compromissos efetivos que levem a resultados tangíveis. São essas algumas das competências-chaves, ou soft skills, que os programas de aprendizagem do Território Appana desenvolvem.
Criamos um espaço de reflexão crítica e criativa para que gestores e líderes possam olhar para seu papel e desafios hoje, também encarar seus medos, inseguranças e vulnerabilidades a fim de criar alternativas próprias para sua atuação no mercado de trabalho do presente e do futuro. No curso Ferramentas de Coaching para Gestores, os líderes são iniciados na cultura do coaching ontológico, conhecendo recursos e conteúdos que lhes permitam gerir ciclos de compromissos, aprimorando sua capacidade de articulação, negociação, gestão de conflitos e desenvolvimentos de pessoas.
Queremos preparar os líderes para serem promotores de diálogos eficazes, seja em reuniões, seja em conversas difíceis. Acreditamos que o papel do líder não é mais o de guru das soluções, mas o de articulador, negociador, gestor de conflitos, apoiador do desenvolvimento da equipe, facilitador de conexões e busca de soluções, ativando a inteligência coletiva do grupo liderado. Um líder que se aperfeiçoa na sua prática, sabendo ouvir e apreciar o grupo, lidando com conflitos nas relações de trabalho, firmando compromissos e coordenando ações congruentes com a organização e seus membros.
João Paulo Ferreira
Executivo, coach Ontológico, pós-graduado em Finanças pelo Insper e aluno de diversas formações do Appana. Liderança, negociação, mediação de conflitos, formação de equipes foram as habilidades que mais desenvolveu em sua carreira executiva.
Carolina Messias
Um ser letral, pesquisadora de processos de escrita, mestre em Literatura e coach com formação comportamental e ontológica. Reúne suas paixões por Comunicação Autoral e Desenvolvimento Humano na Incipit Hub.